Parteiras indígenas, suas práticas e saberes, devem se incluídas nas equipes de atenção à saúde materno-infantil no Alto Rio Solimões

O estudo intitulado "Saberes e práticas das parteiras indígenas: possibilidades de inclusão na Saúde Indígena do DSEI Alto Rio Solimões, Amazonas," apresentado como trabalho de conclusão de mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Condições de Vida e Situações de Saúde na Amazônia (PPGVIDA/Fiocruz Amazônia), revelou a importância das parteiras tradicionais no cuidado de gestantes em comunidades indígenas. Realizado pela aluna Cristiane Ferreira da Silva e orientado pelo professor Júlio Cesar Schweickardt, o trabalho identificou diversos desafios na inclusão das parteiras tradicionais nas equipes de saúde, tais como dificuldades socioeconômicas e educacionais, falta de assistência com biossegurança e a necessidade de um cuidado intercultural efetivo.

Reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), as parteiras tradicionais são essenciais para o acompanhamento de gestantes durante o parto, baseando-se em experiências pessoais e práticas passadas de geração em geração. No Brasil, especialmente nas áreas rurais e indígenas do Norte, elas são responsáveis por uma significativa parcela dos partos domiciliares. No Distrito Sanitário Especial Indígena do Alto Rio Solimões (DSEI ARS), 52% dos partos são conduzidos por parteiras tradicionais, sublinhando sua importância na saúde materno-infantil. Segundo a pesquisa realizada no âmbito do Programa VigiFronteiras-Brasil/Fiocruz, é crucial fornecer apoio político, capacitação e recursos adequados para reconhecer e valorizar os conhecimentos das parteiras, construindo linhas de cuidado interculturais.

A região onde Cristiane realizou o estudo enfrenta desafios como a mobilidade populacional e o difícil acesso aos serviços de saúde. Nesse cenário, foram realizadas análises qualitativas para examinar o trabalho colaborativo das parteiras tradicionais indígenas com as equipes de saúde na área do DSEI ARS. O material resultante descreveu a diversidade do partejar indígena, considerando especificidades éticas, culturais, sociais e demográficas. Além disso, Cristiane também elaborou uma cartografia das estratégias de integração entre as práticas tradicionais e a biomedicina.

O trabalho reforçou o valor inestimável das parteiras tradicionais, mas também propôs caminhos concretos para integrar seus conhecimentos com a biomedicina, visando uma saúde indígena mais inclusiva e eficiente. Um deles é a necessidade de reflexão sobre a invisibilidade dos nascimentos em aldeias indígenas, propondo uma atualização da Declaração de Nascido Vivo (DNV) para que os nascimentos em aldeias sejam devidamente reconhecidos perante a sociedade e o Estado.

Os relatos obtidos durante o estudo também destacaram a importância dos cuidados culturais e da intimidade do ambiente familiar para as mulheres indígenas durante o parto. A pesquisa mostrou a necessidade de diálogo e negociação constante sobre os modos de cuidar e de atuar no território, revelando a complexidade do trabalho das parteiras no processo de parto. A inclusão das parteiras nas equipes de saúde pode, por exemplo, melhorar as condições de parto e reduzir a morbimortalidade materno-infantil, promovendo uma valiosa troca de saberes entre as parteiras e os profissionais de saúde.

O estudo destacou, por fim, a necessidade de políticas e práticas inclusivas e culturalmente sensíveis para melhorar os resultados de saúde materna e neonatal nas comunidades indígenas. A valorização e a integração dos saberes das parteiras tradicionais nas estratégias de saúde são, de acordo com a pesquisa, fundamentais para enfrentar os desafios da região e promover um cuidado mais eficaz e humanizado para as populações indígenas do Alto Rio Solimões. O estudo contou com a participação do dr. Alcindo Antônio Ferla (ILMD/Fiocruz Amazônia) e dra. Camila Pimentel Lopes de Melo (UFPE) na banca examinadora.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil