Tuberculose: estudo comparativo entre comunidades indígenas e não indígenas revela desigualdades na prevalência da doença em Pernambuco

A tuberculose (TB) permanece um grave desafio de saúde pública em Pernambuco, afetando principalmente populações vulneráveis. Comunidades indígenas de áreas rurais enfrentam taxas elevadas de infecção devido ao acesso limitado a diagnóstico e tratamento. O estado possui uma das maiores populações indígenas do Brasil, superado apenas por Amazonas, Pará, Mato Grosso e Maranhão. Entre 2022 e 2023, Pernambuco ocupou o quarto lugar em incidência de casos de tuberculose no país.

No estudo "Tuberculose na população indígena e não indígena no estado de Pernambuco (2010-2022): diferenças na distribuição espacial e temporal", a enfermeira Taciana Souza de Oliveira Meira analisou casos notificados da doença. A pesquisa revelou que a taxa de TB foi significativamente maior entre indígenas comparado a não indígenas, evidenciando barreiras socioeconômicas, culturais e de acesso aos serviços de saúde.

A pesquisa comparou o número de casos e a prevalência entre os grupos, além de investigar a evolução temporal da doença, utilizando dados populacionais do IBGE 2022 e do Sistema de Informação de Tratamento Específico de Tuberculose (SAPT). O teste de Wilcoxon, apontou que a taxa média de tuberculose por município na população indígena foi de 115 casos por 100 mil habitantes, enquanto entre não indígenas essa média foi de apenas 7 por 100 mil habitantes. Para verificar a normalidade das distribuições, foi aplicado o teste de Shapiro-Wilk, que indicou que ambas as amostras não seguem distribuição normal (Indígenas: W = 0,164; p < 0,05; Não indígenas: W = 0,938; p < 0,05). 

Para chegar a essas conclusões, Taciana analisou os casos notificados de tuberculose entre indígenas (270) e não indígenas (64.949) em Pernambuco, com base em dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e do Sistema de Informação de Tratamentos Especiais da Tuberculose (SITETB). 

A análise espacial até 2020 identificou uma maior concentração de casos de tuberculose na Região Metropolitana, com uma distribuição mais ampla ao considerar diferentes faixas de incidência. A taxa média da doença foi mais elevada na porção leste de Pernambuco, tanto entre indígenas quanto não indígenas, reflexo da alta densidade populacional e das condições sanitárias precárias. Também foram identificados focos de tuberculose no Sertão e na região do São Francisco. Na região oeste do estado, a população indígena corresponde a 106.634 pessoas, distribuídas entre diversas etnias que vivem em terras indígenas localizadas no Agreste e no Sertão pernambucano. O estudo considerou a distribuição da população indígena em Pernambuco, destacando os dez municípios mais populosos: Pesqueira, Tacaratu, Carnaubeira da Penha, Águas Belas, Recife, Cabrobó, Jatobá, Petrolina, Salgueiro e Ibimirim. As etnias legalmente reconhecidas no estado incluem os Xucuru (Pesqueira), Kambiwá (Ibimirim, Inajá e Floresta), Pankararu (Petrolândia e Tacaratu), Fulni-ô (Águas Belas), Kapinawá (Buíque), Truká (Cabrobó) e Atikum (Carnaubeira da Penha).

O estudo realizado por Taciana também identificou áreas de alta concentração da doença, cercadas por municípios que também registram um número expressivo de casos. Enquanto a capital Recife registrou o maior número de casos de tuberculose no geral (30.015), Canhotinho teve o menor índice (288). A Ilha de Itamaracá apresentou o maior coeficiente de incidência (579,3/100 mil hab), e Olinda, o menor (63,3/100 mil hab) considerando tanto indígenas quanto não indígenas. Na análise temporal, feita até 2022, observou-se um declínio acentuado nos casos da população geral após 2020 devido à subnotificação no período pandêmico, com taxa de crescimento composta anual de -36,6%, refletindo uma queda média de 6.599 casos nos últimos dois anos. No entanto, entre 2019 e 2020, houve um aumento de 5% ao ano. 

Embora a maioria da população indígena esteja na região central do estado, muitos buscam tratamento na Região Metropolitana do Recife (RMR), onde há maior oferta de infraestrutura de saúde. A pesquisadora destaca que, para haver um controle eficaz da TB, é essencial adotar abordagens culturalmente sensíveis e promover maior participação indígena nas estratégias de prevenção e tratamento. “A tuberculose não atinge as populações de maneira igualitária, ela penaliza fortemente as pessoas que estão vulneráveis socialmente. Na compreensão dos resultados do estudo de raça e etnia, no caso dos indígenas, apontam para o processo histórico de invisibilidade desse grupo”, ressalta.

A pesquisa desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Graduação de Saúde Pública do do IAM/Fiocruz Pernambuco, que integra o consórcio para oferta do Programa VigiLabSaúde/Fiocruz, teve orientação da professora Louisiana Regadas de Macedo Quinino, da Fiocruz Pernambuco. 

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