
Pesquisa avalia condutas profissionais e fluxos de diagnóstico adotados contra a leishmaniose visceral no Amapá
A leishmaniose visceral (LV) é uma zoonose crônica de caráter sistêmico e elevada letalidade, configurando um importante desafio para a saúde pública. De acordo com o Ministério da Saúde, a doença pode levar a óbito em até 90% dos casos não tratados. Por afetar tanto cães quanto humanos, demanda atenção especial dos profissionais que atuam nos serviços de vigilância e controle de zoonoses. O Amapá está atualmente classificado como área de baixo risco para LV. Porém, o registro de casos autóctones em humanos e cães, além da confirmação da presença do vetor transmissor, são fatores que indicam um potencial significativo para a expansão da doença na região.
Diante da escassez de dados mais robustos sobre a ocorrência da leishmaniose visceral naquele estado, a pesquisadora Patricia Andrade Viegas desenvolveu o estudo “Conhecimentos, atitudes e práticas de profissionais que atuam na vigilância e controle das zoonoses, médicos veterinários e estudantes de medicina veterinária: um olhar sobre a leishmaniose visceral canina no estado do Amapá”. O trabalho revelou que mais de 50% dos médicos veterinários entrevistados demonstraram um nível elevado de conhecimento sobre a LV.
Em relação aos tutores e a população em geral, aproximadamente 80% dos veterinários acreditam que o conhecimento sobre a doença seja baixo. Através de um formulário online, a pesquisa observacional transversal avaliou o nível de conhecimento sobre a doença, as atitudes, as condutas e medidas de controle e fluxos de atendimento/diagnóstico adotados. Participaram 24 médicos veterinários, 44 estudantes de medicina veterinária e 8 profissionais que atuam na vigilância e controle de zoonoses.
Foi observado um aumento na frequência de animais suspeitos de LVC, especialmente no município de Macapá. No entanto, a maioria dos profissionais de saúde animal, incluindo veterinários e técnicos do controle de zoonoses, desconhece ou não realiza adequadamente o processo de notificação dos casos suspeitos, bem como o fluxo laboratorial necessário para a confirmação diagnóstica.
Entre as principais medidas de controle da leishmaniose visceral, o uso de coleiras impregnadas com inseticidas destacou-se como a estratégia mais recomendada pelos grupos analisados. Sendo indicada por 100% dos médicos veterinários, 87,5% dos profissionais que atuam no controle de zoonoses e 59,1% dos estudantes de medicina veterinária. Cerca de 60% dos veterinários afirmaram não indicar ou nunca ter utilizado o medicamento Milteforan no tratamento da doença. A eutanásia de cães infectados segue sendo amplamente aceita e aplicada por profissionais e serviços de vigilância de zoonoses: 40% dos veterinários e técnicos se declararam favoráveis ao procedimento, 25% se posicionaram contra e 12,5% afirmaram adotá-lo apenas como último recurso em situações
específicas.
Em 12,5% dos casos relatados por veterinários e profissionais das zoonoses, nenhuma medida foi tomada após a confirmação da infecção em cães, o que evidencia importantes lacunas nas ações de controle e prevenção da leishmaniose visceral.
Em relação às unidades de vigilância de zoonoses, foi observado que apenas uma realizou o inquérito sorológico uma única vez. Apenas duas unidades mantêm ações de monitoramento entomológico, e somente um técnico afirmou que, em sua área de atuação, existe um programa específico com plano de ação implantado para o controle da leishmaniose visceral. Além disso, 75% das unidades não realizam campanhas educativas sobre a doença.
O estudo de Patrícia reforça a necessidade de ampliar as pesquisas sobre a leishmaniose visceral canina (LVC) no estado do Amapá, com o objetivo de produzir dados e indicadores epidemiológicos que contribuam para caracterizar a ocorrência da doença e orientar estratégias mais eficazes de controle.
A pesquisadora destaca a importância da implantação e estruturação das unidades locais de vigilância, bem como da criação de uma rede integrada de monitoramento da LV, envolvendo órgãos públicos, instituições privadas e a sociedade civil. Para ela, essa articulação é fundamental para a adoção de medidas preventivas conjuntas e efetivas no enfrentamento da zoonose.
A pesquisa foi apresentada como trabalho de conclusão do Mestrado Profissional em Epidemiologia em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz), que integra o consórcio para oferta do Programa VigiLabSaúde-Fiocruz. A aluna recebeu orientação do professor Guilherme Loureiro Werneck, da ENSP/Fiocruz.
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