Formação, cooperação e dados: seminário da Fiocruz debate vigilância em saúde nas fronteiras

Com a presença da vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Marly Cruz, e de representantes da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS) e do Ministério da Saúde, o 3º Seminário Internacional do Programa Educacional em Vigilância em Saúde nas Fronteiras (VigiFronteiras-Brasil) reuniu especialistas de destaque para debater os desafios e avanços na vigilância em saúde nas regiões de fronteira. O evento foi realizado na manhã da última segunda-feira, 28 de julho, na sede da Fiocruz Amazônia, em Manaus (AM), com transmissão ao vivo pelo canal da VideoSaúde no YouTube, com tradução simultânea para espanhol e Libras. O encontro abriu a disciplina Seminários Avançados de Tese IV, última etapa do curso de doutorado, dedicada à apresentação dos resultados das pesquisas desenvolvidas pelos doutorandos como parte de suas teses de conclusão. Conduzida pela coordenadora geral do programa, Eduarda Cesse, a mesa de abertura também contou com a presença da coordenadora acadêmica, Andréa Sobral; da diretora do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), Stefanie Lopes.

Eduarda Cesse abriu o evento agradecendo a presença de todos e destacou que o desenvolvimento da vigilância em saúde na região de fronteiras depende da cooperação, da construção coletiva e do fortalecimento de redes colaborativas nacionais e internacionais. Andréa Sobral destacou que muitos dos alunos já estão com suas teses em estágio avançado, prestes a serem defendidas. Ela desejou que “esta seja uma semana intensa, produtiva, e que consigamos concluir os trabalhos de forma significativa e com perspectivas promissoras para os alunos”.

A diretora do ILMD/Fiocruz Amazônia, Stefanie Lopes, anfitriã das atividades, ressaltou a importância do fortalecimento das unidades regionais da Fiocruz. “Ações como esta são muito ricas para as unidades regionais. Formar pessoas que pensem fora da caixa para a vigilância em fronteiras é essencial. Sucesso e vida longa ao programa”. Ela também reforçou a relevância da atuação na região amazônica. “A Amazônia é a maior fronteira do Brasil e precisa de um olhar diferenciado. O VigiFronteiras vislumbra isso. É importante formar e nucleá-los aqui, para que possamos olhar com mais atenção para nossas fronteiras”.

“Nesse cenário em que a gente tem falado muito sobre a internacionalização e sobre a formação em saúde, é importante destacar o fortalecimento da cooperação Sul-Sul”, comentou Marly Cruz, ao fazer uma reflexão sobre o papel do programa no contexto da cooperação internacional. “O Programa VigiFronteiras-Brasil é um exemplo concreto de integração. Podemos destacá-lo como um programa que já traz muitas lições aprendidas”, ressaltou. Ela também enfatizou o valor das alianças institucionais para a continuidade da iniciativa. “Esse programa não seria possível se não fosse também um trabalho bem estabelecido nessa parceria. Agradecemos a todos os docentes e parceiros que estão sempre conosco, bem como aos programas envolvidos neste consórcio”, comentou.

Palestras sobre vigilância em saúde

A vice-presidente Marly Cruz abriu as palestras do seminário falando sobre “O papel da formação para o monitoramento, avaliação e vigilância em saúde nas fronteiras”, ressaltando os compromissos da Fiocruz na formação de profissionais para atuação em cenários complexos e em territórios estratégicos como a Amazônia. Marly propôs uma reflexão sobre o papel da instituição no campo da formação, indo além da vigilância e saúde para incluir também o monitoramento e a avaliação em uma perspectiva integrada.

Ela abordou, ainda, questões estruturais e sociais que afetam a atuação nas regiões de fronteira, como o avanço das desigualdades sociais, a violência armada e a ameaça crescente da desinformação. “Sobretudo na questão da migração e da educação, nos voltamos para a nossa realidade, considerando que temos enfrentado grandes problemas nas nossas fronteiras, que são bastante complexos devido à mobilidade populacional, à falta de infraestrutura e à ocorrência de doenças transmissíveis”, comentou. Na palestra, ela também destacou a relevância dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) como referência para a atuação estratégica da Fiocruz nas fronteiras, com base em quatro dimensões: social, ambiental, econômica e institucional. Marly chamou atenção para o Objetivo 18, da equidade étnico-racial, um objetivo fundamental para o desenvolvimento de projetos e ações no âmbito das fronteiras.

Em seguida, foi a vez de  Rodrigo Frutuoso,  integrante da Coordenação de Emergências, Evidência e Inteligência em Saúde da OPAS/OMS, ministrar a palestra “A importância da cooperação internacional na vigilância em saúde e no fortalecimento da segurança sanitária nas fronteiras”. Ao abordar o tema, ele ressaltou que vivemos em um mundo interconectado, onde doenças infecciosas não respeitam fronteiras geográficas ou políticas. Por isso, as regiões de fronteira, marcadas por intenso intercâmbio social, econômico e cultural, tornam-se também zonas de circulação de riscos sanitários.

Como exemplo, Frutuoso destacou o fortalecimento da rede de Vigilância Genômica das Américas, lançada em 2021, para ampliar a capacidade de sequenciamento genético frente a doenças infecciosas emergentes. “Algo que a pandemia nos ensinou é que ninguém está seguro até que todos estejamos seguros”, reforçou Frutuoso, defendendo que a cooperação internacional se tornou indispensável. Ao final da apresentação, ele reforçou o compromisso da OPAS/OMS com o programa. “A cooperação não é um gesto de caridade, ela é uma estratégia inteligente de sobrevivência coletiva em tempos de risco compartilhado. A cooperação internacional não é um favor entre os países, é um pacto ético pelo bem comum”. Ele concluiu reconhecendo o VigiFronteiras como um verdadeiro laboratório de inovação em saúde pública, e um investimento que deve ser valorizado, ampliado e replicado.

A terceira palestra teve como tema “Nova estratégia de inteligência epidêmica para fortalecer o alerta precoce para emergências de saúde 2024–2029”, e foi conduzida pela chefe da Unidade de Informação em Emergências em Saúde e Avaliação de Risco da OPAS/OMS, Maria Almiron, parceira do Programa VigiFronteiras-Brasil/Fiocruz, desde a época da sua concepção. Ela destacou a importância de oferecer formação acessível como o VigiFronteiras, aos profissionais que atuam diretamente nas regiões de fronteira e que, muitas vezes, não têm tempo ou oportunidade de realizar mestrado ou doutorado.

Segundo Almiron, o objetivo é qualificar esses profissionais para que possam desenhar estudos, atuar em cooperação internacional e beneficiar diretamente as populações atendidas. “Essa iniciativa liderada pelo Brasil é única nas Américas”, destacou. Na apresentação, ela relembrou uma das principais lições da pandemia: “a informação, por si só, é insuficiente se não for transformada em inteligência útil para a ação”. Destacou que, para isso, é essencial a capacidade de coletar dados de diferentes fontes, triangular e interpretar essas informações, além de promover o compartilhamento efetivo entre setores.

Almiron também chamou atenção para a urgência de capacitação contínua em todos os componentes da inteligência epidêmica, incluindo comunicação e compartilhamento das informações geradas. Ressaltou ainda a importância de garantir recursos financeiros para a implementação dessa estratégia, tanto em nível nacional quanto regional.

Vivian Gonçalves, coordenadora-Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços do Ministério da Saúde, representou Guilherme Werneck, diretor do Departamento de Ações Estratégicas de Epidemiologia e Vigilância em Saúde e Ambiente, da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde (DAEVS/SVSA/MS) no evento. Em sua apresentação, que encerrou o seminário, ela abordou os “Desafios e reflexões sobre a implementação da Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNVS)”, traçando um breve histórico da PNVS, e apresentou um vídeo da primeira Conferência Nacional de Vigilância em Saúde, destacando o caráter participativo da política, que não nasce de uma iniciativa governamental, mas sim de uma deliberação do Conselho Nacional de Saúde.

A coordenadora-geral reforçou que a PNVS busca integrar diferentes áreas da vigilância, como ambiental, sanitária, epidemiológica e saúde do trabalhador, superando a lógica da fragmentação. Defendeu a articulação entre essas frentes como essencial para a efetividade das ações em saúde pública e chamou atenção para a necessidade de incorporar estratégias que possam permitir avançar sobre os desafios da implementação. “Para isso, precisamos de estudos, pesquisas e ações que qualifiquem a produção de conhecimento”, afirmou. Ao encerrar a palestra, enfatizou o papel dos trabalhadores e militantes do SUS como agentes ativos na consolidação das estruturas organizacionais: “O sucesso da Política Nacional de Vigilância em Saúde está atrelado ao fortalecimento do SUS.”

As palestras completas do seminário podem ser conferidas, na íntegra, no canal da VideoSaúde Distribuidora da Fiocruz: